Sueli Carneiro tem um artigo com título “Mulheres em Movimento”, do qual eu pego emprestado para intitular esse texto. Segundo Sueli “o feminismo transforma as mulheres em novos sujeitos políticos” e durante esse meu processo de movimento por outros espaços com outras mulheres que também estão em movimento pude perceber como essa frase me contempla.
Durante
algum tempo estive preocupada com o “Empoderamento Terceirizado” conceituei por
empoderamento terceirizado o hábito comum em acreditar que o empoderamento é
algo que independe da nossa pré-disposição, ou seja, da nossa busca e anseio.
Compartilhei esse incômodo no meu perfil e li inúmeros comentários, em especial
li o comentário da professora Luciana Mariano, no qual, ela fala que o seu
empoderamento se dá através do empoderamento de outras mulheres (Mulheres em
movimento) e que inclusive eu sou uma referência para ela.
A partir
desse comentário compreendi que eu estava errada ao acreditar que o
empoderamento estava dividido em duas etapas sequenciais:
1ª Etapa:
Empoderamento Individual
2ª Etapa:
Empoderamento Coletivo
Eu
realmente acreditava que sem o empoderamento individual não seríamos capazes de
alcançar o empoderamento coletivo. Acreditava que essa sequencia era imutável. Primeiro
passaríamos pelo empoderamento individual e somente após ele chegaríamos ao
empoderamento coletivo. Como eu disse: Eu estava errada!
Sigo
acreditando nas duas etapas, porém não existe uma ordem cronológica, pelo
contrário, o processo ocorre em um ciclo. Esses processos de empoderamento
estão interligados. O empoderamento individual leva ao empoderamento coletivo,
assim como, o empoderamento coletivo leva ao empoderamento individual. De
qualquer maneira, precisamos de ambos para seguirmos em frente.
Ontem enquanto
ouvia a Jurema Werneck falar eu fiquei bastante emocionada e preocupada. Ela
disse que além de herdeiros/as, somos herança. Herdamos a luta das nossas
ancestrais, herdamos as causas pelas quais Dandara,
Luísa Mahin, Carolina de Jesus, Luíza Bairros, Aqualtune e inúmeras outras
lutavam. Somos herdeiras dos encaminhamentos da Constituição de 1988, somos
herdeiras dos mecanismos que possibilitaram nosso ingresso e permanência no
ensino superior (Conquistas que o governo TEMER pretender ceifar), somos
herdeiras da construção de creches, dos direito ao SUS, da pílula
anticoncepcional, enfim, nós somos herdeiras. E por sermos herdeiras precisamos
começar a nos preocupar com qual será a nossa herança.
Creio que
a nossa geração tem um mecanismo muito importante: O Ciberativismo. No entanto,
precisamos começar a fazer bom uso disso. Admito que eu me isento da
responsabilidade de tentar dialogar com quem não se predispõe, mas quem quer
dialogar, colar junto, somar compreendendo que o nosso propósito é maior do que
as diferenças pessoais e as vertentes (que mais parecem religiões) eu estou
aqui. Meu inbox está disponível e além de aparecer nos eventos proposto por
nós, me comprometo a buscar espaços para nós, me comprometo a buscar mecanismo
que possibilitem o dessilenciamento (Seja ele qual for, onde for).
Li
algumas coisas referentes a mim naquela postagem na qual eu expus uma agressão verbal,
e confesso que eu fiquei preocupada com as mulheres negras que comentaram ali,
pois além de me repudiarem (?????) ainda utilizaram o discurso do “Não se
vitimize” e aqui estou eu pensando na infelicidade que é uma Preta adotar o
discurso da branquitude. Um discurso que coloca todas as nossas questões como “mimimi”
e vitimização. Pretas, abandonem ou ressignifiquem esses conceitos pejorativos
que a nós são destinados, e lembrem-se que eu, assim como vocês, não preciso me
vitimizar, não preciso criar situações ou fingir marcas de opressões. Eu não
preciso, pois como uma mulher preta, gorda, acadêmica e ciberativista eu sei o quão
desgastante são os enfrentamentos constantes, sei o quão adoecedor é se sentir
sozinha e eu me sinto sozinha todas às vezes que eu levanto uma questão que
para mim é uma opressão declarada, mas que para as minhas (Irmãs Pretas) não é
e por isso deixam passar despercebido.
Nós somos
inúmeras, somos plurais e eu não peço sororidade, porque acredito que não temos
maturidade ainda para lidar com sororidade (Talvez seja uma missão para as
nossas herdeiras). Mas acredito em reciprocidade e, além disso, sei que mesmo
discordando e até mesmo não gostando do posicionamento de algumas pretas/os eu
não irei deslegitimar os movimentos que esses estão fazendo com os mecanismos
que possuem, diferente da branca que estava me deslegitimando na faculdade eu
não preciso protagonizar negativamente narrativas que não me pertencem.
Gostaria
de salientar que conforme ouvi durante o “II
Congresso sobre o pensamento das Mulheres Negras no Brasil”: PRETA
OBEDIENTE NÃO COMBINA COM MILITÂNCIA!
E eu não
pretendo ser obediente, submissa ou silenciosa. Eu não pretendo ser amada fingindo
não ver ou silenciando outras pretas. Nós precisamos entender que militância
não é clube da Luluzinha, as nossas ações políticas são o marco maior nessa trajetória
e para desenvolver ações políticas precisamos estar em ritmo com o movimento
uma das outras. Nós precisamos descobrir o que nos une e partir desse
princípio, precisamos nos tornar mulheres em movimento, precisamos fugir
urgentemente dos títulos e das vertentes que apenas nos separam e reconhecer
que nós, através das nossas especificidades, estamos em movimento e precisamos
fazer algo por nós e pelas nossas.
Sobre as nossas singularidades, Sueli Carneiro diz que “essa condição faz com esses sujeitos assumam, a partir do lugar em que estão inseridos, diversos olhares que desencadeiam processos particulares subjacentes na luta de cada grupo particular. Ou seja, grupos de mulheres indígenas e grupos de mulheres negras, por exemplo, possuem demandas específicas que, essencialmente, não podem ser tratadas, exclusivamente, sob a rubrica da questão de gênero se esta não levar em conta as especificidades que definem o ser mulher neste e naquele caso. Essas óticas particulares vêm exigindo, paulatinamente, práticas igualmente diversas que ampliem a concepção e o protagonismo feminista na sociedade brasileira, salvaguardando as especificidades. Isso é o que determina o fato de o combate ao racismo ser uma prioridade política para as mulheres negras, assertiva já enfatizada por Lélia Gonzalez, ‘a tomada de consciência da opressão ocorre, antes de tudo, pelo racial’.”
Quando eu
falo que precisamos descobrir o que nos une, estou dizendo também que
precisamos parar de acreditar que a nossa geração independe das lutas e
conquistas travadas por nossas antepassadas. Precisamos reconhecer que nós
temos história, precisamos nos apossar das nossas narrativas. Lembro que Djamila
Ribeiro comentou na terça-feira algo mais ou menos assim: “Durante um diálogo e/ou discussão é quase automático buscar as
feministas brancas como alicerce e referência apagando as nossas próprias referências”.
É comum
ler as citações de Simone de Beauvoir, Margareth Rago e inúmeras outras
feministas brancas sem sequer notar que nós temos nossas próprias referências,
temos nossa própria produção intelectual e precisamos citá-las. Nós (Mulheres
Negras), precisamos aprender a recorrer as nossas escrevivências como convida Conceição Evaristo, precisamos citar Lélia Gonzalez, Cláudia Pacheco, Jurema
Werneck, Nilma Lino Gomes, Claúdia Pons Cardoso, Sueli Carneiro, Bell Hooks, Chimamanda
Ngozi Adichie, Luiza Bairros, Zelinda Bairros, Núbia Regina Moreira, Rosália de
Oliveira Lemos, Paulina
Chiziane, Angela Davis, Beatriz Nascimento e inúmeras outras intelectuais negras.
Essa ridicularização
que ocorre quando citamos outras autoras precisa ser repensada, esse hábito de
nos taxar como academicistas como se isso fosse algo ruim precisa ser
repensado. Não deveria ocorrer essa ridicularização por nós conseguirmos trazer
outras abordagens para o palco da discussão. Leio as críticas feitas às pretas acadêmicas
como se nós estivéssemos distantes de vocês que ainda não estão nos espaços acadêmicos,
aliás, leio as críticas como uma espécie de recusa a pertencer a esses espaços.
Só que o intuito deveria ser justamente estar nesses espaços, espaços que fazem
parte do legado das nossas e dos nossos ancestrais. Essa rivalidade é
incoerente, e até parece que na academia estamos tendo acesso a um vasto
referencial teórico e uma constante biografia africana/afro-brasileira.
Não é bem
assim, infelizmente o ensino ainda é eurocêntrico. Por isso, bora pensar
mecanismos para que vocês estejam aqui, ocupando esses espaços para juntxs somar
conosco e lutar para que, por exemplo, as disciplinas de gênero, raça e
sexualidade deixem de ser optativas e se tornem obrigatórias, para que a Lei
10.639/03, – que torna obrigatório o ensino da história e cultura
afro-brasileira e africana nas redes públicas e particulares da educação –,
comece a ser eficaz na prática.
Por fim,
termino dizendo que além de nos citar através das nossas produções, precisamos
estar em movimento, como ouvi ontem na oficina Juventude Negra e Empoderamento:
“Precisamos criar uma rede de mulheres em movimento. Como disse Dai costa: “Eu não faço parte de um movimento, não faço
parte de uma instituição. Eu sou o movimento!”. Como disse Bell Hooks: “Eu não sou feminista, eu defendo o feminismo”.
Talvez esse seja o momento de nós nos afastarmos um pouco dos títulos e pautar
quais são as ações políticas que juntas precisamos defender.
Que texto foda! Eu amei! Obrigada pela referências. Irei procura-las. Todas elas! Obrigada preta. Teu texto é empoderador. Teu empoderamento, me empodera.<3
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